É preciso saber conduzir a vida diante da grandeza colocada à frente
Uma jovem, fã absoluta da cantora inglesa Amy Winehouse, ainda inconformada com o seu trágico destino, dizendo-se em total estado de perturbação com o acontecimento, pergunta-me “porque tem que ser assim?”, citando Kurt Cobain, Jeff Buckley e tantos outros e pede uma resposta, aquela que não consegue encontrar. Para alguém de 22 anos e considerando a dificuldade de expressão da galera, atualmente, um e-mail muito bem escrito e situado.
Explicação para a morte, seja suicídio ou não, evidentemente não há. Quem está dentro das pessoas para saber de seus conflitos, nessas horas? Recorro então a William Shakespeare, o bardo conterrâneo de Amy, ao proclamar “nem todos estão à altura de seu destino”, frase que sempre mexeu comigo e de forma saudável levou-me a avaliar muitas vezes se eu estava à altura do meu.
Com certeza o dramaturgo se referia às potências que algumas pessoas trazem ao nascer e que se desenvolvem em talentos, muitas vezes, em genialidade, expressas em sua tendência de individuação. Ou às chances que assim como favorecem trazem imensas responsabilidades. Vide atores, artistas plásticos, herdeiros de grandes fortunas ou títulos de nobreza. Que podem não conseguir acompanhar emocionalmente os privilégios que receberam desse destino: o Eu fica muito aquém da imagem, principalmente pelas cobranças feitas por quem é incapaz de perceber isso. E toda a mídia, assim como a sociedade, desconhece o que pode significar essa discrepância.
Em não havendo o apoio familiar, um ambiente carinhoso de afeto ou ajuda psicanalítica, essas pessoas, vivendo no centro do furacão, acabam se perdendo e sequer percebem. Sem o suporte da consciência, recorrem às drogas, ao exagero, à bebida, como falso mecanismo de defesa para esconder a fragilidade. Um claro exemplo foi a monumental cantora, até hoje não igualada, Elis Regina, entre mil outros talentosos e brilhantes que não souberam conduzir suas vidas diante da grandeza colocada à frente.
Ainda mais quando o sucesso chega rápido e se confunde com fama, o dinheiro vem fácil e o poder assume dimensões assustadoras. É quando questões menores passam à frente da insuperável arte ou das benesses recebidas. Surgem então os escândalos, o escancarado dos vícios, a ânsia de desacatar, de ostentar ou humilhar, claros sinais de insegurança.
Realmente nem todos estão à altura de seu destino: receberam muito, não valorizaram na medida, queimaram etapas preciosas, fugiram dos questionamentos e da preciosa análise, foram dominados pela vaidade, desvairaram no convencimento, deixaram-se envolver pela bajulação. E se perderam. Ou se acharam numa linha de fuga, sabe-se lá?
Mas no caso de um grande talento, como Amy, a insuperável arte permanece para sempre.