O assassinato misterioso de um zoólogo espanhol no Paquistão em 2002 é o ponto de partida de um livro intrigante sobre vida, cultura e humanidade
Nem só os jornalistas são vítimas da brutalidade do terrorismo nos países do Oriente Médio: em agosto de 2002, o zoólogo espanhol Jordi Magraner foi brutalmente assassinado no Paquistão junto com seu assistente por motivos ainda desconhecidos.
Gabi Martínez, considerado um dos grandes nomes da literatura espanhola moderna, explora a história por trás da morte do zoólogo e cria um livro impecável para os fãs de uma boa aventura e de uma pessoa que é diferente e segue um estilo de vida diferente.
Só Para Gigantes (tradução de André Pereira da Costa; Editora Rocco, 416 páginas, R$ 47,50) narra a viagem que eles fez para o Paquistão para investigar a morte de Magraner, que passou 15 anos nas montanhas do Paquistão investigando a existência do mitológico homem das neves, até ser encontrado morto.
Martínez visitou a comunidade dos kalasch, onde o zoólogo viveu, e teve acesso aos diários íntimos de Magraner para traçar o perfil desse cientista à moda antiga – aventureiro, romântico e contraditório – que, ao que tudo indica, foi executado pelos talibãs.
Viagem do zoólogo Jordi Magraner ao Paquistão
Após ter percorrido por mais de dez anos o norte do Paquistão e o noroeste do Afeganistão, Magraner transformou-se em um líder da tribo dos kalash, de origem indo-europeia, que vivia em conflito com os muçulmanos daquela região. Ele ajudou os kalash a preservar sua cultura oral formando professores, e o seu trabalho humanitário coincidiu com a ascensão do Talebã e o ambiente que se tornava mais tenso e violento.
Um dos momentos mais interessantes da história foi quando a família de Magraner, baseada na França, veio a público pedir justiça por seu assassinato. Como ele era uma espécie de “cidadão do mundo” – nascido na França, criado na Espanha e vivendo de foram ambulante no Afeganistão e Paquistão -, nenhuma nação assumiu Magraner como seu cidadão. “O status de estrangeiro constante o deixou à margem, também, da Justiça”, disse o escritor em entrevista à Folha.
Outro aspecto interessante é quando Martínez percebeu que sua visão europeia e seus valores foram colocados em xeque quando chegou ao Paquistão. “Um europeu chega a uma zona como essa pronto a entender tudo, disposto a contemporizar, mas no final acaba entendendo que alguns conflitos são de uma ordem mais profunda e, talvez, só possam ser resolvidos de forma violenta”.
Só Para Gigantes explora muito bem essa questão do homem vivendo fora da sua cultura, das escolhas e de uma vida que foge dos padrões pré-estabelecidos pela sociedade. Magraner era uma figura curiosa e interessante, e o seu assassinato só mostra que essa liberdade que tanto almejam não existe – e a comunidade científica e humanitária fica triste com o fim desse pesquisador.
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