Não se pode querer que as situações e comportamentos venham a nós e não nós a eles
Um Instituto americano que se dedica aos estudos da superação, essa capacidade de ultrapassar as adversidades da vida sem se destruir, o Resiliency Al Albert Center, de Emory, coloca dois grandes prejuízos do comportamento humano na luta por superar: a superficialidade do intelecto e o exagero no ser metódico, disciplinado em excesso.
Considerando como superficialidade, não o prazer das coisas boas, o requinte e menos ainda a vaidade e sim, o desinteresse em aprofundar o questionamento, a dificuldade em refletir, a preguiça de pensar. Enquanto que o pensamento é o deleite de alguns, para outros é um peso. Tem tudo a ver, já que para se conseguir superar, é preciso a prática reflexiva.
Quanto ao ser metódico, é óbvio: as pessoas muito rígidas com horários, hábitos, compromissos; que estabelecem uma rotina e não transigem um milímetro, apavoram-se com situações não previstas e qualquer turbulência vira ameaça. Logo, os problemas de enfrentamento se tornam maiores do que são, o adaptar-se uma tarefa quase impossível e a superação, complicada.
Tem muita gente que não percebe que mudam as regras do jogo e precisamos nos adequar às novas situações. Como a mulher que se separa ou fica viúva e continua a sair apenas com casais. Por mais amigos que sejam, um dia, isso se torna inadequado, ela terá que formar um novo grupo de relacionamento com pessoas na mesma condição e disponibilidade. Também o filho depois que casa e a mãe não percebe que as regras mudaram e que ela não pode ligar para ele pela manhã, insistindo para que venha comer o bifinho acebolado “que ele adora e só ela sabe fazer”.
Gente, não dá! Nuanças, ginga de cintura, flexibilidade; não se supera em mão única. E muito menos querendo que as situações e o comportamento das pessoas venham a nós e não nós a elas. Um exemplo é uma conhecida que se casou com um viúvo com três filhos e insiste no “se fossem meus filhos”. Tentei mostrar-lhe que não são e ela precisa saber como lidar. E por aí vai. Por tantas vezes mudaram as regras do meu jogo. Em tantos setores da existência e do relacionamento…
De filho único mimado para provedor, de provedor permanente para alguém que passa a viver sozinho. De orientado a orientador, de aluno a mestre e por aí afora. As coisas mudam, os nossos sentimentos se maleabilizam, a disposição se amplia ou se reduz, as chances aumentam ou diminuem. Só a consciência pode se ampliar sempre quando a lucidez de perceber as mudanças chega e se instala. Mas o preço é alto, a luta é grande, muito grande. Por isso, quem atinge a superação se torna um sobrevivente, não um vencedor.
A característica na sobrevivência é a arte de reagir, não importa o tamanho do problema. O que vale é a forma e a inteligência de assimilar novas regras, custe o que custar.
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