Livro de memórias resgata a história de uma família que sobreviveu ao governo ditatorial e sangrento de Robert Mugabe no Zimbábue

Cento e Quatro Cavalos

A História da África é fascinante – e saber que toda essa história é formada por memórias é mais fascinante ainda.

Em Cento e Quatro Cavalos (tradução de Antônio E. de Moura Filho; Editora Rocco, 320 páginas, R$ 48,50) conhecemos a história da família de Mandy Retzlaff que, de modo muito sincero e real, conta como lidou com os problemas que recaíram sobre os brancos durante o regime do ditador Robert Mugabe no Zimbábue (e que, ainda hoje, se encontra no poder).

Diferente do romance ficcional Fora das Sombras, que retrata a vida de um garoto britânico e sua relação com os negros nesse mesmo período, Cento e Quatro Cavalos é quase que uma aventura cinematográfica com fazendas, lugares paradisíacos e o perigo que espreita os Retzlaff.

O Zimbábue, localizado no coração da África, era considerado por Mandy e seus familiares a materialização do paraíso. A família ganhava a vida com agricultura em amplas áreas verdes, todas férteis. Mas a fazenda também era responsável pelo cultivo de mais profunda paixão do patriarca Pat, sua mulher Mandy e os filhos Paul, Jay e Kate: os cavalos.

Os animais eram integrantes da família e tinham nomes e personalidades próprios. Por isso, quando o paraíso começa a se desfazer sob as mãos de Mugabe, forçando os Retzlaff e inúmeros proprietários de terra a abandonar o país, a família empreende uma verdadeira cruzada para salvar a vida de seus leais amigos e de seus vizinhos levando-os à fronteira com Moçambique e arriscando a própria pele no caminho.

Diante desse governo sanguinolento, fazendeiros começaram a ser expulsos de suas terras. A família Retzlaff resistiu o quanto pôde, mas, em determinado momento, decidiram que não valia a pena o risco. Escondendo-se em propriedades ainda intocadas pelas mãos do presidente e seus aliados, Pat também levava seus cavalos: corriam histórias de que os invasores, quando não deixavam os animais à míngua, os banhavam com gasolina e tacavam fogo.

Cavalos de fazendas vizinhas foram integrados ao grupo de salvamento organizado pela família Retzlaff. Depois de anos de luta, eles conseguiram fugir do Zimbábue levando 104 cavalos. Pat e Mandy deixaram para trás um paraíso reduzido a frangalhos, com terras cultiváveis absolutamente subaproveitadas. Os invasores acabaram com as plantações e estragaram o solo, destruindo a única fonte de economia do Zimbábue: a agricultura.

O livro não serve apenas para contar a história da família Retzlaff ou exaltar os seus feitios heroicos. Cento e Quatro Cavalos mostra o poder de uma pequena ação e a humanização proveniente da escolha de uma família diante de um fato que mudou uma nação e a história de um país. Mas, acima de tudo, faz uma reflexão sobre o modo como o ser humano age diante de situações críticas e no momento em que a coragem precisa ser posta à prova.

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