A casta brilha mais a cada dia na Alsácia e mundo afora
A Alsácia já foi da Alemanha um dia. A região voltou aos domínios da França no inicio do século XX passado e por isso tem a mais importante plantação de Riesling fora da Alemanha. Vale ressaltar que a Riesling só é plantada nessa região, não tendo presença em nenhum outro local de toda a França. A região vitívinícola da Alsácia começa ao sul da capital da região, Strassbourg e vai até as cercanias da cidade de Mulhouse. A cidade mais importante incrustada em meio aos vinhedos é a charmosa cidade de Colmar, que fica a poucos quilômetros da fronteira com a Alemanha. É só partir de Colmar na direção leste, cruzar o Reno e você já estará na Alemanha (pouco mais de 50 quilômetros separam Colmar de Freiburg, já na Alemanha). São inúmeras as cidades importantes dessa região que vivem quase que exclusivamente da produção de vinhos. As mais especiais são Ribeauville, Bergehein, Kayserberg e Riquewihr, sendo essa última uma cidade medieval “murada”, onde fica localizada a Vinícola da Família Hugel, que produz vinhos desde 1639.
A expressão dos Riesling dessa região são de maneira geral mais encorpados e alcoólicos se comparados com a grande maioria dos irmãos da Alemanha. Na Alsácia temos um desafio ainda maior no entendimento do estilo dos vinhos se comparado com os da Alemanha, onde, principalmente os grandes produtores, informam no rótulo, por exemplo, se o vinho é seco ou meio seco (lembra do halbtrocken ou o feinherb da semana passada?). É comum com muitos vinhos alsacianos depois de abertos (dependem muito do ano da colheita) você ter uma surpresa, achando que o vinho era seco e na hora da degustação você perceber que o açúcar residual é alto e daí você não está à frente de um branco seco e sim um meio-seco. É mesmo um grande desafio. Para deixar ainda mais claro isso, damos uma pala do que abordaremos na semana que vem. Não há nada especifico em nenhum rótulo dos vinhos dessa região até chegarmos aos vinhos doces, daí tudo fica mais simples. Nos rótulos dos Alsacianos doces encontramos duas informações chaves, a saber: Vendange Tardive e Seléction de Grains Nobles. Traduzindo o primeiro trata-se de um colheita tardia, com boa porcentagem de uvas atacadas pelo fungo Botrytis Cinéria*. Já o segundo, como os Trockenbeerenauslese da vizinha Alemanha, são produzidos com uvas 100% atacadas pelo botrytis. Mas o detalhamento dos vinhos doces da Riesling fica para a semana que vem.
Os Rieslings Alsacianos disponíveis no Brasil e que merecem destaque
Dos alsacianos disponíveis no Brasil o destaque vai para, dentre outros, os vinhos do legendário produtor Hugel. Tanto seu vinho base o Riesling 2009 quanto o seu topo de linha o Riesling Jubillee 2004 fizeram um ótimo papel. O primeiro é um vinho interessante e mostra tudo que essa uva pode nos propiciar. Linda cor amarelo claro translúcido com toques esverdeados. No nariz tem mel, toques minerais e um final levemente amanteigado. No palato é agradável, sutil e com um final pungente. O segundo é um vinho espetacular. A fruta desse vinho que é o top Riesling da casa (dos secos) e que, segundo Etienne Hugel, “é a interpretação da família para um grande Riesling”, vem do vinhedo Grand Cru Schoenenbourg. É desse vinhedo e do “vizinho” Schlossberg que podemos encontrar os mais reluzentes Rieslings de toda a Alsácia. Na boca, é seco e elegante. Retrogosto longo e muito especial.
Ainda da Alsácia recomendamos o apetitoso Riesling 2007 do produtor Paul Blanck. Um branco de raça com boa profundidade. Seus toques no nariz de mel, florais e cítricos seguidos de bom corpo e uma bela persistência na boca o colocaram como um dos excedentes vinhos básicos da Alsácia degustados.
Na sequência tivemos um dos melhores Brancos da França, que passa safra entra safra, está sempre os melhores e dessa vez não foi diferente. O Riesling Grand Cru Schlossberg Cuvée Ste Catherine 2007 produzido pela Domaine Weinbach estava extraordinário.
Essa Domaine, que cultiva suas vinhas através da agricultura Biodinâmica, está localizada em Kayserberg, no coração da Alsácia, produz tanto secos quanto doces que estão entre os mais imponentes e disputados vinhos brancos do mundo. Estava de tirar o fôlego e foi o campeão dentre todos, mostrando que a Alsácia produz alguns Riesling superiores a muitos alemães. Foi isso que aconteceu em nossa degustação, com vitória francesa. Mas não se esqueçam, a casta em questão produz diferentes estilos de vinhos. Esse Weinbach é um Grand Cru de estilo profundo, mais alcoólico e com um corpo muito presente, diferente da maioria dos alemães secos que degustamos. Muito perto em termos de qualidade do Grand Cru da Domaine Weinbach ficou o extraordinário (ainda jovem) Riesling Grand Cru Kaefferkopf Granit 2009 do produtor Martin Schaetzel. (Rótulo do Espetacular Grand Cru Alsacioano de Martin Schaetzel). As vinhas desse produtor ficam localizadas na comuna de Ammerschwihr, a pouquíssimos quilômetros a sudoeste de Kayserberg. Produzido com rendimentos baixíssimos esse concentrado Grand Cru é muito aromático. Em boca é suculento e seu final muito longo. Um vinhaço.
Do produtor Dopff au Moulin provamos o Riesling Cuvée Europe Reserve 2006. Um branco interessante, mas já com uma evolução notória. Olfativamente não é marcante, exatamente por já estar com boa evolução. Melhora com o tempo na taça e desenvolve certa complexidade. Na boca é um vinho focado e típico. Para quem quer conhecer um Riesling Alsaciano básico com boa evolução esse garrafa é uma boa pedida. Está prontíssimo para o consumo.
O último branco seco da Alsácia também elaborado a partir de uvas com cultivo biodinâmico foi o Riesling 2008 da Domaine Marcel Deiss. Esse produtor cuja Domaine se localiza na charmosa Vila de Berghein é de certa maneira radical, pois é um dos únicos da região que “não respeita muito” as normas da Apelação Controlada (AOC) e ainda produz vinhos não varietais que é a norma da AOC (os vinhos da Alsácia tem no rótulo sempre o nome da uva, o que Deiss não segue a risca). Marcel faz blend Pinot Gris, Riesling e Gewuztraminer, por exemplo. Esse vinho com 13o de álcool é “estiloso” e rico, mas a classe e a tipicidade da Riesling estão presentes. Seu final de boca é persistente e firme. Delicioso.
Riesling Mundo afora
De todos os países os que mais despontam são a Áustria (tem muita tradição, mas poucos vinhos a base da Riesling são encontrados aqui no Brasil), a Nova Zelândia (mais presença na Ilha Sul do país) e a Austrália. Esse último produz a cada dia melhores vinhos a base dessa sensacional uva. E o melhor, produz em várias regiões desde o Oeste (Western Austrália) nas cercanias de Perth até o sul da Austrália (South Australia) nos arredores de Adelaide, com mais força nos vales de Eden e Clare. A oferta de Rieslings australianos no Brasil tem aumentado significativamente nos últimos 2 anos. Além desses países também temos uma bela evolução na plantação e produção de bons Rieslings nos Estados Unidos (na Califórnia e com mais ênfase no Hudson River Valley, no Estado de Nova York) e principalmente no Chile.
Do novo mundo a briga foi muito interessante, pois os Rieslings australianos estão cada vez melhores. Degustamos quatro Rieslings desse país e tivemos muita sorte, pois dois deles estavam deliciosos e os outros estavam sublimes, podendo de certa maneira competir de igual para igual com muitos alemães e alsacianos. Os melhores de todos da Austrália foram o Wakefield Jaraman Riesling 2009 e o Hardys HRB D639 Riesling 2008. O primeiro é um vinho branco com uma personalidade marcante. Mineral com muita fruta nos aromas (maçãs e pêras) e seu corpo é uma verdadeira potência. Vinho onde o enólogo colocou uvas de dois importantes Vales da Australia, Clare e Eden Valley. Um dos grandes Rieslings disponíveis no mercado local, principalmente para quem aprecia os Brancos com mais corpo.
Coincidentemente o HRB 2008 (Heritage Reserve Bin – alusão ao blend com tradição) é também a criação de um enólogo, que nesse caso radicalizou, com um blend inusitado. 70% das uvas colhidas para a elaboração desse imponente branco vem do Clare Valley (mais tradicional no plantio de Riesling) com o restante proveniente da Ilha da Tasmânia. Um blend calculado, pois os aromas cítricos e o palato concentrado vem da fruta do Clare Valley e a complexidade e a acidez, da fruta da Tasmânia. Uma experiência em todos os sentidos. Um branco eletrizante.
Os outros dois australianos tiveram uma performance excelente e chegaram muito perto dos vinhos descritos acima. Deliciosos, reluzentes e repletos de caráter disputaram passo a passo e tecnicamente chegaram empatados. Foram eles o jovem e fresco Angove Long Row Riesling 2010 e o presente e firme Wakefield Riesling 2008, o primeiro do South Australia e o segundo do berço da Riesling na terra dos cangurus, o Clare Valley.
Da terra dos esportes radicais, a Nova Zelândia, brilham também bons Riesling, ao lado dos já consagrados Sauvignon Blanc. Degustamos também quatro exemplares todos da Ilha Sul desse país, sendo três do Norte dessa Ilha (2 de Marlborough e 1 de Nelson) e outro do Sul, de Central Otago.
A medalha de ouro desse país vai para o esplendoroso Neudorf Riesling Brightwater 2006, das cercanias de Nelson. Apresenta muita fruta cítrica (limão, lima etc), maçãs e um toque delicioso toque doce no final (delicioso e muito, muito sutil). Seus toques minerais são marcantes. Esse foi o Riesling mais mineral de todos degustados do novo mundo. O paladar é gostoso e firme, com um delicioso final. Uma experiência única.
De Marlborough merecem destaque os excelentes Grove Mill Riesling 2007 e o Saint Clair Vicar’s Choice Riesling 2008. Ambos muito frescos, repletos de vida e com boa tipicidade da casta. O primeiro marcou ainda mais pelo seu incrível caráter floral e mineral. A vinícola Grove Mill foi a 1ª viniciola do Mundo a ser certificada como Carbon Zero. De Central Otago o Gibbston Valley Riesling 2006 estava impressionante. Repleto de alegria, vida e ainda jovialidade, apesar de ser um vinho com cinco anos, esse vinho aromaticamente estava equilibrado com maçãs, peras e tons cítricos, finalizando com tons florais. Na boca possui bom corpo, excelente volume de frutas e uma deliciosa acidez. Como muitos Riesling, apresenta certo toque de doçura. Pode ser enquadrado no estilo meio-seco. Uma encantadora surpresa.
Finalmente destacamos três representantes das Américas, um da Califórnia e dois do Chile. O Trefethen Dry Riesling 2008, do Napa Valley, é um vinho sob certo aspecto “tímido” nos aromas, mas estava com tudo na medida certa com bom equilíbrio entre o álcool, a fruta e a nuance mineral. Acompanhou muito bem uma porção de presunto cru bem gorduroso. Já do Chile, tivemos o mais alcoólico dentre os Riesling do novo mundo, o Leyda Neblina Single Vineyard 2007. Bem mais forte em todos os sentidos que seus rivais (imponentes 14º de álcool), mas com bom conjunto, tendo como destaque sua presença de frutas cítricas e um elegante e leve tom floral. Apesar de já com boa evolução, tem o caráter mineral da casta. Muito bom. Deve ser consumido imediatamente.
Para nossa alegria o último vinho foi um Riesling bem mais jovem, o que de certa maneira faria um contraponto com o surpreendente 2007 da Viña Leyda (Vale de Leyda é um Vale incrustado no Vale de Santo Antonio). Pois bem, o Riesling Malvilla 2009 da Viña Chocalan é uma grata surpresa. Essa Vinícola tem produzido excepcionais tintos e brancos, apesar de ser uma casa com poucos anos de vida. A casa é comandada pela determinada Aida Toro, que vem imprimindo um ritmo frenético, principalmente com relação a qualidade dos vinhos. A propósito foi dessa vinícola que foram servidos dois vinhos ao Presidente Barak Obama quando de sua recente visita ao Chile. Esse vibrante branco produzido com fruta do Vale do San Antonio a sudoeste de Santiago é provocante nos aromas com boa carga de fruta e o estilo mineral que um Riesling tem que ter. Em boca, por ser mais jovem 2 anos que o outro chileno destacado no painel, tem muito mais vibração e vivacidade. Um ponto importante é que o vinho melhorou muito depois de alguns minutos na taça. Retrogosto marcante e firme. Um raçudo Riesling de nosso continente.
*-> O Botrytis Cineria é um fungo que se apresenta em condições climáticas específicas. Ele fura a casca da uva e causa a perda de líquido da fruta, que se enruga e tem seus açúcares concentrados. Normalmente as uvas ficam expostas ao sol por mais algumas semanas antes da colheita final.
Na semana que vem fechamos com chave de ouro nossa matéria dedicada a essa maravilhosa casta, com os raros, caros e dos sonhos Riesling Doces. Até lá.
Os vinhos Domaine Hugel e Angove são importados para o Brasil pela WorldWine – www.worldwine.com.br
Os vinhos Gibbston Valley e Trefethen a são importados para o Brasil pela Vinci Vinhos – www.vinci.com.br
Os vinhos Domaine Weinbach, Saint Clair e Viña Leyda são importados para o Brasil pela Grand Cru – www.grandcru.com.br
Os vinhos Domaine Paul Blanck são importados para o Brasil pela Decanter – www.decanter.com.br
Os vinhos Martin Schaetzel são importados para o Brasil pela Viníssimo – www.vinissimo.com.br
Os vinhos Domaine Marcel Deiss e Dopf Au Moulin são importados para o Brasil pela Mistral – www.mistral.com.br
Os vinhos Neudorf e Grove Mill são importados para o Brasil pela Premium – www.premiumwines.com.br
Os vinhos Wakefield são importados para o Brasil pela Casa Flora – www.casaflora.com.br
Os vinhos Hardys são importados para o Brasil pela Aurora – www.aurora.com.br
Os vinhos Viña Chocalan são importados para o Brasil pela Magnum (Rede Vino!) – www.magnumimportadora.com